O episódio da entrada de Jesus na cidade de Jerusalém pode ser encontrada em Mateus: 21; 1-11, Marcos: 11; 1-10 e Lucas: 19; 29-38. O ambiente que o acolhe, porém, era particular sendo que, se dúvidas existissem das narrativas dos evangelhos canónicos, Amélia Rodrigues esclarece que estávamos nos “… últimos dias antes da Páscoa. O mês de Nissan (Abril/Maio) se iniciara sob lufadas frias decorrentes do largo Inverno que ainda não terminara.” (Dias Venturosos, pp. 75 e 76).
Não obstante o rigor meteorológico, os judeus optam por sair à rua para aclamar a entrada de Jesus. Mas o motivo de tal manifestação nada tem a ver com a mensagem de amor, esperança, perdão e caridade que o Cristo havia divulgado nos últimos anos. A intenção era outra. Descontentes com a opressão militar romana e profundamente revoltados com a gestão tributária do império, o “… povo judeu suspirava por alguém, com bastante autoridade, que o libertasse dos opressores. (…) Jesus simbolizava a renovação, a promessa.” É por esta razão que os populares o saúdam efusivamente, e ainda que os discípulos de Jesus se deixem inebriar pela projeção mediática momentânea, consequência de tamanha manifestação, eventualmente convencidos que o acolhimento se devia ao reconhecimento da superioridade dos ensinos e feitos de seu Mestre, ”Jesus agradecia aos manifestantes de Jerusalém com o olhar mostrando, porém, melancólicos sorrisos.” (Lázaro Redivivo, XVII)
O Messias não se enganava na avaliação que fazia e este sentimento é sublinhado num relato menos conhecido de Meimei quando nos descreve que “O Mestre (…) sobre o animalzinho cansado, parecia triste e pensativo. Talvez refletisse que a alegria ruidosa do povo não era o tipo de felicidade que ele desejava. Queria ver o povo contente, mas sem ódio nem revolta, inspirado pelo bem que ajuda a conservação das bênçãos divinas.”
Mas eis que ocorre um facto que passou despercebido aos evangelistas e que é interessante de ser recordado. No momento em que Jesus antecipava a hipocrisia do conjunto e o sofrimento em solidão, foi quando, aparecendo de entre a multidão eufórica, uma “linda jovem se destacou (…), abeirou-se dele e lhe entregou uma braçada de rosas, exclamando: – Senhor, ofereço-te estas flores para o Reino de Deus.” Mais uma vez a juventude surgia na parábola real como símbolo da ingenuidade própria dos humildes. De entre tantos que gritavam quase descontroladamente por tão pouco, a simplicidade de quem ignorava o propósito da maioria comove o espírito mais elevado de entre todos. “O Cristo fixou nela os olhos cheios de luz e indagou: – Queres realmente servir ao Reino do Céu? – Oh! Sim… – disse a moça, feliz. – Então – pediu-lhe o Mestre – Ajuda-me a proteger o burrico que me serve, trazendo-lhe um pouco de capim e água fresca.” A lição parece clara. Para quem se dispõem a assumir o compromisso e para quem tem a tarefa de o distribuir: – Todos podem ajudar, a todos deve ser dada a oportunidade de servir pois existe sempre aquele que é mais carenciado. Independentemente da evolução, do conhecimento ou das posses de cada um, todos somos chamados a contribuir, na medida em que o possamos. À jovem deste momento, a tarefa que lhe coube foi a de socorrer o burro que transportava o Mestre.
Mas mais importante do que a extensão da tarefa é a resposta que é dada aquando da convocatória. Por isso Meimei conclui referindo que “A jovem entendeu prontamente e começou a compreender que, na edificação do Reino Divino, Jesus espera de nós, acima de tudo, a bondade sincera e fiel do coração.” (Meimei: Pai Nosso, A lição da bondade). Quanto à maioria restante, sabemos qual o final. “(…) À acalorada recepção de Jesus, entrando triunfalmente em Jerusalém, sucedeu-se a difamação… Nuvens carregadas de insegurança e medo pairavam sobre a cidade monumental… Cochichos anunciavam a tragédia tramada…” (Dias Venturosos, pp. 75 e 76). E qual a nossa escolha?
Hugo Batista e Guinote
Ponte de Luz-ASEC