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{"id":1162,"date":"2011-05-20T17:13:13","date_gmt":"2011-05-20T17:13:13","guid":{"rendered":"http:\/\/aela.pt\/?p=1162"},"modified":"2011-05-20T17:15:48","modified_gmt":"2011-05-20T17:15:48","slug":"doutrina-falta-de-formacao-doutrinaria","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/aela.pt\/doutrina-falta-de-formacao-doutrinaria","title":{"rendered":"Doutrina – falta de forma\u00e7\u00e3o doutrin\u00e1ria"},"content":{"rendered":"

Sem a forma\u00e7\u00e3o doutrin\u00e1ria, n\u00e3o teremos um movimento esp\u00edrita coeso e coerente. E, sem coes\u00e3o e coer\u00eancia, n\u00e3o teremos Espiritismo. Essa a raz\u00e3o por que os Esp\u00edritos Superiores confiaram \u00e0s m\u00e3os de Kardec o pesado trabalho da Codifica\u00e7\u00e3o. Kardec teve de arcar, sozinho, com a execu\u00e7\u00e3o dessa obra gigantesca. S\u00f3 ele estava em condi\u00e7\u00f5es de realiz\u00e1-la. \"\"<\/a><\/p>\n

Depois de Kardec, o que vimos? L\u00e9on Denis foi o \u00fanico dos seus disc\u00edpulos que conseguiu manter-se \u00e0 altura do mestre, contribuindo vigorosamente para a consolida\u00e7\u00e3o da Doutrina. Era, aparentemente, o menos indicado. N\u00e3o tinha a forma\u00e7\u00e3o cultural de Kardec, residia na prov\u00edncia, n\u00e3o convivera com ele, mas soubera compreender a posi\u00e7\u00e3o metodol\u00f3gica do Espiritismo e n\u00e3o a confundia com os desvarios espiritualistas da \u00e9poca. Depois de Denis, foi o dil\u00favio. <\/p>\n

A Revista Esp\u00edrita virou um saco de gatos. A Sociedade Parisiense de Estudos Esp\u00edritas naufragou em \u00e1guas turvas. A Ci\u00eancia e a Filosofia Esp\u00edritas ficaram esquecidas. O aspecto religioso da Doutrina transviou-se na ignor\u00e2ncia e no fanatismo. Os sucessores de Kardec fracassaram inteiramente na manuten\u00e7\u00e3o da chama esp\u00edrita, na Fran\u00e7a. E, quando a Arvore do Evangelho foi transplantada para o Brasil, segundo a express\u00e3o de Humberto de Campos, veio carregada de parasitas mortais que, ao inv\u00e9s de extirpar, tratamos de cultivar e aumentar com as pragas da terra. Tudo isso por qu\u00ea? Por falta pura e simples de forma\u00e7\u00e3o doutrin\u00e1ria. A prova est\u00e1 a\u00ed, bem vis\u00edvel, no fluidismo e no obscurantismo que dominam o nosso movimento no Brasil e no Mundo.<\/p>\n

Os poucos estudiosos, que se aprofundaram no estudo de Kardec, vivem como n\u00e1ufragos num mar tempestuoso, lutando, sem cessar, com os mesmos destro\u00e7os de sempre. N\u00e3o h\u00e1 estudo sistem\u00e1tico e s\u00e9rio da Doutrina. E o que \u00e9 mais grave, h\u00e1 evidente sintoma de fascina\u00e7\u00e3o das trevas, em vastos setores representativos que, por incr\u00edvel que pare\u00e7a, combatem por todos os meios o desenvolvimento da cultura esp\u00edrita.<\/p>\n

Enquanto n\u00e3o compreendermos que Espiritismo \u00e9 cultura, as tentativas de unifica\u00e7\u00e3o do nosso movimento n\u00e3o dar\u00e3o resultados reais. Dar\u00e3o aproxima\u00e7\u00f5es arrepiadas de conflitos, aumento quantitativo de adeptos ineptos, estimula\u00e7\u00e3o perigosa de messianismos individuais e de grupos. Flamarion, que nunca entendeu realmente a posi\u00e7\u00e3o de Kardec, e chegou a dizer que ele fez obra um tanto pessoal, como se v\u00ea no seu famoso discurso ao p\u00e9 do t\u00famulo, teve, entretanto, uma intui\u00e7\u00e3o feliz quando o chamou de bom senso encarnado. Esse bom senso \u00e9 que nos falta. Parece haver se desencarnado com Kardec, e volatizado com Denis.<\/p>\n

Hoje, estamos na era do contra-senso. Os mesmos \u00f3rg\u00e3os de divulga\u00e7\u00e3o doutrin\u00e1ria que pregam o obscurantismo exibem pavoneios de erudi\u00e7\u00e3o personalista, em nome de uma cultura inexistente. Porque cultura n\u00e3o \u00e9 erudi\u00e7\u00e3o, livros empilhados nas estantes, fich\u00e1rio em ordem para consultas ocasionais. Cultura \u00e8 assimila\u00e7\u00e3o de conhecimentos e bom senso em a\u00e7\u00e3o. O que fazer diante dessa situa\u00e7\u00e3o? Cuidar da forma\u00e7\u00e3o esp\u00edrita das novas gera\u00e7\u00f5es, sem esquecer a alfabetiza\u00e7\u00e3o de adultos. Mobral: esse o recurso. Temos de organizar o Mobral do Esp\u00edrito. E come\u00e7ar tudo de novo, pelas primeiras letras. Mas, isso em conjunto, agrupando elementos capazes, de mente arejada e cora\u00e7\u00e3o aberto. Foi por isso que propus a cria\u00e7\u00e3o das Escolas de Espiritismo, em n\u00edvel universit\u00e1rio, dotadas de amplos curr\u00edculos de forma\u00e7\u00e3o cultural esp\u00edrita.<\/p>\n

Podem dizer que h\u00e1 contradi\u00e7\u00f5es entre Mobral e n\u00edvel universit\u00e1rio. Mas, nota-se, que falamos de Mobral do Esp\u00edrito. A Cultura Esp\u00edrita \u00e9 o desenvolvimento da cultura acad\u00eamica, \u00e9 o seguimento natural da cultura atual, em que se misturam elementos crist\u00e3os, pag\u00e3os e ateus. Para iniciar-se na cultura esp\u00edrita, o estudante deve possuir as bases da cultura anterior. “Tudo se encadeia no Universo”, como ensina, repetidamente, O Livro dos Esp\u00edritos. Quem n\u00e3o compreende esse encadeamento, tem de iniciar pelo Mobral. N\u00e3o h\u00e1 outra forma de adapt\u00e1-lo \u00e0s novas exig\u00eancias da nova cultura. A verdade nua e crua \u00e9 que ningu\u00e9m conhece Espiritismo.<\/p>\n

Ningu\u00e9m, mesmo, no Brasil e no Mundo. Estamos todos aprendendo, ainda, de maneira canhestra. E se me permito escrever isto, \u00e9 porque aprendi, a duras penas, a conhecer a minha pr\u00f3pria indig\u00eancia. No Espiritismo, como j\u00e1 se dava no Cristianismo e na pr\u00f3pria filosofia grega, o que vale \u00e9 o m\u00e9todo socr\u00e1tico. Temos, antes de tudo, de compreender que nada sabemos. Ent\u00e3o, estaremos, pelo menos, conscientes de nossa ignor\u00e2ncia e capazes de aprender. Mas, aprender com quem? Sozinhos, como autodidatas, tirando nossas pr\u00f3prias li\u00e7\u00f5es dos textos, confiantes nas luzes da nossa ignor\u00e2ncia? Recebendo li\u00e7\u00f5es de outros que tateiam como n\u00f3s, mas que estufam o peito de auto-sufici\u00eancia e pretens\u00e3o? Claro que n\u00e3o. Ao menos isso devemos saber.<\/p>\n

Temos de trabalhar em conjunto, reunindo companheiros sensatos, bem intencionados, n\u00e3o fascinados por mistifica\u00e7\u00f5es grosseiras e evidentes, capazes de humildade real, provada por atos e atitudes. Assim conjugados, poderemos aprender de Kardec, estudando suas obras, mergulhando em seus textos, lembrando-nos de que foi ele e s\u00f3 ele o incumbido de nos transmitir o legado do Esp\u00edrito da Verdade. Kardec \u00e9 a nossa pedra de toque. N\u00e3o por ser Kardec, mas por ser o int\u00e9rprete humilde que foi, o homem sincero e puro a servi\u00e7o dos Esp\u00edritos Instrutores. \u00c9 o que devemos ter nas Escolas de Espiritismo.<\/p>\n

N\u00e3o Faculdades, nem Academias, mas, simplesmente, Escolas. O sistema universit\u00e1rio implica pesquisas, colabora\u00e7\u00e3o entre professores e alunos, trabalho conjugado e sem presun\u00e7\u00e3o de superioridade de parte de ningu\u00e9m. O simp\u00f3sio e o semin\u00e1rio, o livre-debate, enfim, \u00e9 que resolvem, e n\u00e3o o magister do passado. O esp\u00edrito universit\u00e1rio, por isso mesmo, \u00e9 o que melhor corresponde \u00e0 escola esp\u00edrita. Num ambiente assim, os Esp\u00edritos Instrutores dispor\u00e3o de meios para auxiliar os estudantes sinceros e despretensiosos.<\/p>\n

A forma\u00e7\u00e3o esp\u00edrita exige ensino met\u00f3dico, mas, ao mesmo tempo, livre. Foi o que os Esp\u00edritos deram a Kardec: um ensino de que ele mesmo participava, interrogando os mestres e discutindo com eles. Por isso, n\u00e3o houve infiltra\u00e7\u00e3o de mistificadores na obra inteiri\u00e7a, nesse bloco de l\u00f3gica e bom senso, que abrange os cinco livros fundamentais de Codifica\u00e7\u00e3o, os volumes introdut\u00f3rios e os volumes da Revista Esp\u00edrita, redigidos por ele durante quase doze anos de trabalho incessante. Essa obra gigantesca \u00e9 a plataforma do futuro, o alicerce e o plano de um novo mundo, de uma nova civiliza\u00e7\u00e3o.<\/p>\n

Seria absurdo pensar que podemos dominar esse vasto acervo de conhecimentos novos, de conceitos revolucion\u00e1rios, atrav\u00e9s de simples leituras individuais, sem m\u00e9todo e sem pesquisa. Nosso papel, no Espiritismo, tem sido o de macacos em loja de lou\u00e7as. E incr\u00edvel a leviandade com que oradores e articulistas esp\u00edritas tratam de certos temas, com uma falsa sufici\u00eancia de arrepiar, lan\u00e7ando confus\u00f5es rid\u00edculas no meio doutrin\u00e1rio. Temos de compreender que isso n\u00e3o pode continuar. Chega de arengas mel\u00edfluas nos Centros, de orat\u00f3ria descabelada, de audit\u00f3rios basbaques, batendo palmas e palavreado pomposo. Nada disso \u00e9 Espiritismo. Os conferencistas esp\u00edritas precisam ensinar Espiritismo – que ningu\u00e9m conhece – mas para isso precisam primeiro aprend\u00ea-lo. Precisamos de expositores did\u00e1ticos, servidos por bom conhecimento doutrin\u00e1rio, arduamente adquirido em estudos e pesquisas.<\/p>\n

Expor os temas fundamentais da Doutrina, n\u00e3o \u00e9 falar bonito, com tropos pretensamente liter\u00e1rios, que s\u00f3 servem para estufar vaidade, \u00e0 maneira da orat\u00f3ria bacharelesca do s\u00e9culo passado. Esse palavr\u00f3rio vazio e presun\u00e7oso n\u00e3o constr\u00f3i nada e s\u00f3 serve para ridicularizar o Espiritismo ante a mentalidade positiva e anal\u00edtica do nosso tempo. Estamos numa fase avan\u00e7ada da evolu\u00e7\u00e3o terrena. Nossa cultura cresceu espantosamente nos \u00faltimos anos e j\u00e1 est\u00e1 chegando \u00e0 conflu\u00eancia dos princ\u00edpios esp\u00edritas em todos os campos. A nossa falta de forma\u00e7\u00e3o cultural esp\u00edrita n\u00e3o nos permite enfrentar a barreira dos preconceitos para demonstrar ao mundo que Espiritismo, como escreveu Humberto Mariotti, \u00e9 uma estrela de amor que espera no horizonte do mundo o avan\u00e7o das ci\u00eancias. E curiosa e rid\u00edcula a nossa situa\u00e7\u00e3o. Temos o futuro nas m\u00e3os e ficamos encravados no passado mitol\u00f3gico e nas querelas medievais. Mas, para superar essa situa\u00e7\u00e3o, temos de aprender com Kardec.<\/p>\n

Os que pretendem superar Kardec, n\u00e3o o conhecem. Se o conhecessem, n\u00e3o assumiriam a posi\u00e7\u00e3o rid\u00edcula de cr\u00edticos e inovadores do que, na verdade, ignoram. Chegamos a uma hora de defini\u00e7\u00f5es. Precisamos definir a posi\u00e7\u00e3o cultural esp\u00edrita perante a nova cultura dos tempos novos. E s\u00f3 faremos isso atrav\u00e9s de organismos culturais bem estruturados, funcionais, dotados de recursos escolares capazes de fornecer, aos mais aptos e mais sinceros, a forma\u00e7\u00e3o cultural de que todos necessitamos, com urg\u00eancia.<\/p>\n

Texto de Jos\u00e9 Herculano Pires. PIRES, Jos\u00e9 Herculano. O Mist\u00e9rio do Bem e do Mal. 2\u00aa edi\u00e7\u00e3o. S\u00e3o Bernardo do Campo,SP:Editora Esp\u00edrita Correio Fraterno do ABC, 1992. <\/strong><\/p>\n

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